quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

"Soldadó"

Há tantos livros que tenho na prateleira e tanta inércia para os ler, que para quebrar essa inércia, resolvi pegar num livro pequeno, que não me demorasse muito a ler; quis o acaso que esse livro fosse um dos que há mais tempo repousam na prateleira, e é um dos muitos que tenho comprado sobre a Guerra Colonial, pois é um tema que muito me interessa pessoalmente.
O livro em causa chama-se “Soldadó” (não, não é erro, é mesmo este o nome), e é de autoria de Carlos Vale Ferraz (pseudónimo de Carlos Matos Gomes), que nasceu em 1946 em Vila Nova da Barquinha, fez os estudos secundários no Colégio Nun’Álvares em Tomar e frequentou a Academia Militar. Entre 1967 e 1974 cumpriu missões militares em África. O seu primeiro romance e o mais célebre foi “Nó Cego” (1983). A ele se seguiram “De Passo Trocado”(1985) e a novela “Soldadó” (1988). O tema destes livros foi sempre o mesmo: a Guerra Colonial; dentre outros livros publicados posteriormente, alguns dedicados a vivências africanas, mas não exclusivamente sobre a guerra, avulta “Os Lobos não usam Coleira” (1991), que foi adaptado ao cinema – “Os Imortais” de António Pedro Vasconcelos.
“-Os portugueses são o melhor povo do mundo em reconciliações, palavra de honra! - garantiu o capitão Baltazar. - Um português nunca fica de mal com o semelhante para sempre!
- Temos a esperteza suficiente para saber que um dia podemos vir a precisar de um favor dos nossos inimigos… - apoiou o Majorué.
- Sim, se não falássemos àqueles que nos ofenderam a quem iríamos meter cunhas?”



Este pequeno trecho é bem elucidativo de que o teor do livro “Soldadó” de Carlos Vale Ferraz vai muito além da análise do clima de guerra, para esboçar determinadas convicções acerca da maneira de ser das nossas gentes.
Soldadó é um militar deslocado para África, em plena Guerra Colonial. Pouco dotado de inteligência e obediente que nem um cão, Soldadó sente-se às mil maravilhas nas suas funções militares. Acata todas as ordens que os sargentos lhe dão com um «sim, senhor» entusiasta, só se sentindo em segurança ao cumpri-las.
De um combate misterioso que ninguém sabe ao certo como começou, Soldadó foi o único ferido. Abre-se um inquérito para tentar esclarecer os factos ocorridos.
É neste inquérito que os sargentos vão contando ao comandante encarregado do relatório a história incrível de Soldadó – o seu nascimento em Cabeça Seca, a sua incursão na vida militar, a viagem para África a bordo do Niassa, as suas funções militares em África.
Com muito humor, são também relatados pitorescos e caricatos acontecimentos militares, pondo em causa toda a instituição militar e, muito particularmente a Guerra Colonial.


Estou agora a ler, com entusiasmo crescente "Nó Cego" e cada vez mais sinto que devo completar a saga "A guerra cá do João", aqui no blog, mas como se diz, "o rabo é o que mais custa a esfolar"...











22 comentários:

  1. Talvez seja um livro que terei na prateleira...

    Beijoca

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  2. " Nó Cego" foi um dos melhores livros que li sobre a guera colonial. Há tanto tempo! Vou ler este "Soldadó"! Aguçaste-me o apetite.

    Beijinhos

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  3. Livros como esse, nunca me despertaram muito o interesse, não sei bem porquê.. Talvez um dia a minha opinião acerca deles mude, hehe.

    Beijinhosss

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  4. Ainda bem que existe a reconciliação!
    Abraço!

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  5. Martinha
    é um bom livro para teres uma noção da vida dos jovens portugueses (do sexo masculino) nesses tempos de guerra.
    Hoje, esses tempos, só existem na memória de quem os viveu...
    Beijinhos.

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  6. Isabel
    "Nó cego" parece ter bastante de autobiográfico, pois o autor foi oficial dos Comandos e houve realmente no norte de Moçambique uma grande operção, planeada com minúcia para acabar com importantes bases de guerrilheiros da Frelimo e que se chamou "Nó Górdio"...
    Beijinho.

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  7. Sandrinha
    não és só tu; a maior parte da nossa juventude não sabe nada do que foi a Geurra Colonial, e é uma pena; livros vai havendo, filmes, poucos e nenhum sobre a realidade nua e crua da guerra; a nossa memória é curta.
    Se um dia tiveres curiosidade lê os textos que eu fui escrevendo sobre esses tempos, pessoalmente, está claro e com o título "A Guerra cá do João"...
    Beijinhos.

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  8. Amigo Lampejo
    neste diálogo do livro a "reconciliação" está a ser usada como um termo real é certo, mas com forte sentido critico...
    Abração.

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  9. Vincenzo
    para quem queira compreender um pouco melhor o que foi a Guerra Colonial, os livros deste autor são fundamentais.
    Abraço amigo.

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  10. João Carlos, também o li. Aliás, tenho a colecção completa dos volumes editados pelo DN sobre a Guerra Colonial. Mas há também uma antologia (2 volumes) literária sobre a GC excelente, na D Quixote, nem parece ter sido organizada por essa coisa inenarrável chamada João Melo (e nem se atrevam a dizer que adoraram o Gente Feliz com Lágrimas). A Guerra Colonial foi um tema que me interessou há anos atrás, pois andava com um projecto sobre o tema que se ficou pelas 10 páginas, mas faltou-me o fôlego para avançar.
    PS: já ouvi falar num romance sobre a Guerra Colonial que inclui tb a experiência homossexual da soldadesca, mas entretanto esqueci quer o nome do autor (sei que n é do Guilherme nem do Pitta)quer o títuo, se por acaso souberes, avisa

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  11. Manuel
    eu tenho uma colecção razoável de livros sobre esse tema e claro que conheço o livro que referes; trata-se de "Até Hoje (memórias de cão)", de um autor chamado Álamo Oliveira; presumo que não seja fácil encontrá-lo hoje, pois é de 1988 e de uma editora que desconheço se ainda existe: Signo.
    A capa é muito bela e sugestiva.
    Se estiveres interessado em relê-lo diz, que tenho prazer em te o emprestar.
    Abração.

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  12. só li o Nó Cego, e já há bastantes anos. a ver se um dia destes me cruzo com este Soldadó que, a avaliar pela tua nota, deve ser bem interessante.
    abraço

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  13. Miguel
    é um livro pequeno e interessante por abordar através de uma personagem quase surrealista, o universo de um grupo de pessoas que estão juntas numa guarnição militar, mas também com considerações acerca do nosso povo.
    Abraço.

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  14. É um tema bem interessante, que, como dizes, está muito mal explicado e entendido pela nova geração. Creio que por vezes conhecemos melhor certas épocas mais antigas da nossa história do que esses anos mais recentes.

    Eu por acaso também coleccionei o material que o Manuel Serrano fala que foi editado pelo DN, vídeos incluídos, pois tinha mesmo a sensação de não conhecer essa parte da nossa história, e que até envolveu pessoas minhas conhecidas.

    Ler os teus posts sobre a tua experiencia também tem sido muito esclarecedor para mim. Tenho esperança de um dia ter o privilégio de falarmos sobre o assunto…
    :-)

    Abraço!

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  15. Amigo Sócrates
    é evidente o desconhecimento quase total da geração jovem sobre aquilo a que se chamou a "Guerra Colonial"; mas também nunca houve grande preocupação em explicá-lo.
    A excepção foi uma muito boa série que a RTP apresentou há relativamente pouco tempo: notável!
    Abraço.

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  16. Bem, eu conheci um pouquinho, mas muito pouco, devo confessar, da Guerra Colonial em Moçambique, onde nasci e me criei até dentro dos anos 70.
    Conheci-a, melhor, adivinhei-a, sobretudo através dos que, sendo poucos anos mais velhos, serviam-me de heróis, e que, paulatinamente, inexoravelmente, desapareciam do meu dia-a-dia, regressando meses/anos depois sem que os cenhecesse mais, mudos, quedos, alienígenas ... pareciam outros seres que tivessem nascido de outros pais (mesmo estes, ainda que não o admitindo, experimentavam alguma dificuldade em reconhecê-los doutra forma que não fosse pelo instinto, que este teima em desaparecer - nem as feições eram mais as mesmas, eram pessoas que exibiam alguns "ares" das anteriores - experiência estranha, frustrante, que felizmente nunca mais voltei a ter), e aí percebi que as coisas deviam ser bem diferentes do que me "esclareciam" em casa (fui/sou filho de gente ligada ao regime).
    Só mais tarde me apercebi um pouco mais da extensão do dano, quando tive acesso a documentação oral, escrita e visionada esclarecedora.

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  17. Amigo Manel
    essas tuas vivências e recordações devem ser um formidável álbum de situações perfeitamente únicas; gostaria muito de um dia ter a possibilidade de trocar contigo impressões sobre este assunto.
    Abraço amigo.

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  18. Vim deixar-te um abração, amigo Pinguim. Ainda não encontrei este Soldadó e até gostava de o incluir nos presentinhos de Natal para um amigo que por lá passou e devora tudo quanto inclui esse tema.

    Bom Domingo!

    Beijinhos

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  19. Isabel
    é um livrinho que fazia parte de uma pequena colecção de livros sobre esse tema, publicados pela editora do DN, na altura. Chamava-se "A guerra colonial em livros" e foi o primeiro volume a ser publicado e data de 1997.
    Não sei se isto te ajuda...
    Beijinho.

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  20. Ajuda, com certeza!
    Obrigada, Pinguim!
    Bem-hajas!

    Beijinhos

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  21. Isabel
    só espero que o encontres; não sei se ainda existe, acho que sim, uma loja no Rossio, na esquina com a Rua do Ouro, com publicações da Editorial Notícias; será um lugar a ver...
    Beijo.

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Evita ser anónimo, para poderes ser "alguém"!!!